5 maio 2019 arquivado em: Blog

Com a popularização das redes sociais, nós – artistas – fomos agraciados com uma série de vantagens para reconhecimento e alcance do nosso trabalho, mas também nos deparamos com novos vocabulários e desafios que nunca nos foram apresentados antes, mas que precisamos aprender e nos adaptar para seguir na nossa jornada. Dentre os desafios, um dos mais recorrentes nos dias de hoje são perfis comerciais ou contas famosas utilizando nosso trabalho sem autorização.

uso de ilustrações na internet - por Juliana Rabelo

Peraí! Quer dizer que se eu encontrar uma imagem bonita na internet, tenho que perguntar se posso postar no meu perfil?

Basicamente, sim. Especialmente se o seu perfil, na verdade, for uma conta profissional/comercial e/ou com muita visibilidade. A lista de motivos se baseia na intenção, assumida ou subjetiva, de utilizar a imagem para:

  • promover seu conteúdo;
  • gerar tráfego de público para a sua página;
  • angariar likes e comentários – o famoso engajamento;
  • funções de divulgação, promoção e marketing no geral.

Você percebe como esses itens têm uma função comercial/promocional direta ou indireta, e que você acaba usando o trabalho de um artista para crescer às custas dele? Você está construindo seu caminho de sucesso enquanto o artista não recebe nada em troca. Nem um pouco legal, né?

Mas se tá na internet, é de domínio público!

Nem sempre. É muito comum as pessoas confundirem o significado de domínio público, já que a internet acabou se tornando um “lugar público” de certo modo; mas existe uma diferença, e explico a seguir:

Direito do autor x Domínio Público

Todo criador possui os direitos autorais sobre suas criações, e esses direitos são intransferíveis, mesmo que o trabalho não esteja assinado, e protegem o autor contra o mau uso de suas criações – assim, não é permitido a cópia, reprodução, e muito menos a comercialização das criações sem prévia autorização.

Domínio público significa dizer que a obra não possui propriedade ou restrições de uso, é livre e gratuita. No Brasil, uma obra só entra em domínio público após 70 anos do falecimento de seu criador, ou quando há autorização registrada antes desse período, e passa a constituir o patrimônio cultural da humanidade. Essa contagem varia de acordo com cada país.

São exemplos de obras que pertencem ao domínio público brasileiro: a obra completa do Machado de Assis, a Poesia do Fernando Pessoa, a Música Erudita Brasileira, O Pequeno Príncipe, a obra de Monteiro Lobato (caiu esse ano), dentre outras.

E mesmo que a obra esteja em domínio público, você precisa informar o autor original da obra ao comercializá-la e/ou adaptá-la para outras mídias ou formatos.

Ou seja: se você encontrou a imagem na internet, isso não necessariamente quer dizer que ela seja domínio público. Muito menos que os créditos da imagem pertencem ao Pinterest, Google, etc. Tudo certinho?

Mas eu não sei quem é o dono da imagem!

Sem problemas! O Google Imagens oferece um recurso de busca, onde você facilmente arrasta a imagem no campo de busca e encontra a autoria. Veja:

Essa pesquisa levou menos de dez segundos.

E o FAIR USE?

fair use é um conceito da legislação dos Estados Unidos que permite o uso de material protegido por direitos autoriais sob determinadas condições, que podem ser verificadas no teste de quatro fatores:

  1. o propósito e tipo de utilização, incluindo se o mesmo é de natureza comercial ou educacional sem fins lucrativos;
  2. a natureza do trabalho copiado;
  3. a quantidade e proporcionalidade do copiado em relação ao todo; e
  4. o efeito do uso relativamente ao mercado potencial ou valor do trabalho sob direito de autor.

O fair use não se aplica aqui no Brasil, mas o artigo 46 da Lei 9.610/98 abre algumas lacunas para usos não ofensivos da imagem/obra de arte:

I – a reprodução:

(…) d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários;

II – a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;

III – a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra; (…)

VII – a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou administrativa;

VIII – a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores. (…)

FONTE: Lei 9.610/98, grifos meus.

A violação de direitos autorais é coisa séria: constitui crime previsto por lei, e acarreta em detenção de 3 meses a 4 anos + multas (o valor varia de acordo com cada caso).

Seja uma pessoa legal na internet!

via de regra, o ideal é que você, ao publicar uma arte que não seja de sua autoria, siga os seguintes passos:

  • tagueie o artista na foto;
  • insira os créditos no início da legenda, marcando o artista (exemplo: “ilustração: @julianarabelo.art”).
  • não utilize a imagem para fins comerciais, direta ou indiretamente, nem de promoção da sua marca/negócio/serviço.

Esteja ciente de que seguir esses passos não livra você de uma possível violação da imagem, mas demonstra respeito pelo artista e sua obra, e isso pode facilitar possíveis diálogos/conflitos que possam surgir entre você e o autor.

Em caso de dúvidas, o ideal é que você

  • Procure o autor da imagem – se não estiver assinada ou identificada, esse passo a passo simples e rápido te permite encontrar a autoria no Google Imagens.
  • Entre em contato, de preferência via e-mail, pedindo a permissão para utilizar a imagem.
  • Escute/leia atentamente as condições de uso.

No fim das contas, é tudo uma questão de empatia – se colocar no lugar do artista e fazer algumas perguntas: será que a minha atitude o ofende? Será que estou sendo desrespeitosa (o)? Ao publicar essa imagem, eu estou contribuindo para o crescimento do artista, ou estou desviando seu público e dificultando o acesso do público ao seu trabalho? Será que estou prejudicando o artista a utilizar a sua imagem para atrair lucro ou para promover o meu negócio? Será que o caminho que estou trilhando para crescer está sendo justo e honesto com o trabalho das pessoas que eu admiro?

Medidas protetivas para artistas

Se você é artista, procure desde já tomar todas as medidas protetivas à sua obra possíveis:

  • assine seus trabalhos, se possível registrando pelo menos o ano da criação.
  • organize seus trabalhos, de preferência em plataformas como Google Drive, Google Fotos, Tumblr ou em outro site de sua preferência. Faça um esforço para fazer a publicação original em um desses sites antes de divulgar nas redes sociais, pois são plataformas mais estáveis e resistentes ao tempo.
  • se você trabalha com técnicas tradicionais, digitalize seus trabalhos e os guarde em um local onde seja possível extrair as informações de data/hora da publicação. Se possível, catalogue os originais em uma pasta organizada – eu organizo em pastas e ponho o ano da produção na “lombada” de cada uma delas.
  • registre suas obras na Biblioteca Nacional. Você pode registrar trabalhos individuais, ou portfolios (semestrais, anuais, mensais… de acordo com seu volume de produção) com compilados dos seus trabalhos. Você vai precisar pagar as taxas de registro e de envio do material, mas pense nisso como um investimento a longo prazo na sua carreira.
  • se informe sobre os profissionais de advocacia autoral existentes na sua cidade. Se você mora em Fortaleza e busca indicações, entre em contato e ficarei feliz de compartilhar as profissionais maravilhosas que conheço! 🙂

Fazer uma denúncia oficial nas redes sociais

Encontrou algum perfil utilizando suas imagens sem autorização nas redes sociais? Denuncie! Eu já denunciei usos indevidos das minhas imagens no Pinterest e no Instagram, as redes que mais uso, e tive sucesso (yas!!) – a resposta é bem rápida, inclusive. A plataforma remove a publicação, e o usuário recebe um e-mail notificando que a publicação foi removida. O processo não é tão intuitivo, especialmente no Instagram, então aqui abaixo compartilho um passo-a-passo que talvez ajude:

no INSTAGRAM,

  1. acesse esse link
  2. prossiga para “Saiba mais sobre a denúncia de violações de direitos autorais.”
  3. clique em “este formulário“, e
  4. o preencha com todas as informações corretas – dentre outras coisas, vão pedir seu nome completo, endereço postal, o link da publicação com uso indevido e um link onde seja possível encontrar a publicação autorizada; se você não tiver esse link, é possível enviar um arquivo, também.
  5. aguarde! o Instagram vai te enviar um e-mail com o número da denúncia e depois um feedback sobre o resultado dela.

Algumas dicas:

  • se possível, reserve um tempo do seu dia, pois é um processo não muito intuitivo e um pouco demorado.
  • eu achei bem difícil fazer pelo celular, então prefira fazer em um PC ou dispositivo com uma tela maior, pois será preciso você lidar com abas.

ATENÇÃO, ARTISTA!

Essa é uma situação extremamente desgastante que acontece com muita frequência comigo e com nossos colegas de profissão. Se nós não nos unirmos e pisarmos firme para proteger nossos direitos, nunca conseguiremos reverter esse quadro e mudar a mentalidade das pessoas. Não tenha vergonha ou medo de correr atrás dos seus direitos. Arte não é uma coisa qualquer que se encontra perdida por aí e se faz o que bem entende com ela. Nosso trabalho é uma extensão de quem nós somos, e merece ser respeitado e valorizado por todos!

* * *

FONTES e LINKS EXTRAS

aqui tem pesquisa! 🙂

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amaram
    Instagram: @julianarabelo_art

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